9. Posfácio
Simples
de Coração (1995)
Como
havia dito na postagem sobre o disco Filmes
de Guerra, Canções de Amor, resolvi adicionar um posfácio à série publicada
aqui sobre os discos dos Engenheiros do
Hawaii gravados pela formação Gessinger,
Licks & Maltz. O texto que segue abaixo é uma adaptação de um
comentário que escrevi no blog de Humberto Gessinger em 11 de janeiro de 2012,
quando ele comentava sobre o disco em questão.
Depois da
saída do guitarrista Augusto Licks,
a banda admitiu de imediato o guitarrista Ricardo
Horn, o músico faria alguns shows com Humberto e Carlos ainda no formato
trio. Sem alcançar a sonoridade desejada por eles, ou tentando fugir de se
tornar um cover de si mesma, eles acabaram optando pela entrada de mais dois
novos membros: o guitarrista Fernando
Deluqui (ex-RPM) e o tecladista e acordeonista Paolo Casarin, transformando em quinteto a banda que sempre havia sido um trio.
Simples de Coração foi o primeiro disco da banda a
não sair em vinil. A capa apresentava diferenças estéticas em relação aos
trabalhos anteriores, começando pela ausência das engrenagens (presente nos
sete discos do período GLM) e a mudança da fonte com o nome da banda (na edição
em CD, um adesivo com o nome da banda vinha colado sobre a caixinha de
acrílico, um Sagrado Coração estampava a capa).
No que
tange a música, a banda apresentava inevitavelmente uma nova sonoridade em
função da perda da guitarra tão característica de Augusto Licks. Os Engenheiros
era uma das poucas bandas nacionais que tinha um som reconhecível logo na
introdução de qualquer uma de suas músicas. Agora, eles apresentavam um som
mais denso, de certa forma, devido à maior instrumentação das músicas com o
formato quinteto e ainda a presença de músicos adicionais em várias faixas. Outra
diferença fundamental foi a presença do produtor americano Greg Ladanyi que já havia trabalhado com os Jacksons, Jeff Healey Band,
Kansas, Fletwood Mac, Toto, entre outros, o que levou a banda a gravar em Los Angeles. Talvez pelo fato da banda ainda
estar procurando uma nova cara, juntamente com as referências dos trabalhos anteriores, o
disco acaba por parecer mais com o produtor do que com a banda, o que acaba por
não ser algo totalmente negativo, uma vez que Greg conseguiu um som espetacular
no disco que contou com bons arranjos, e fazendo até com que o fraco
guitarrista (?) Deluqui soasse bem no disco (num nível que nunca o tinha ouvido
nem antes, nem depois em sua carreira). Já com o excelente tecladista Paolo
Casarin ele não deve ter tido muito trabalho, o músico adicionou excelentes
teclados e acordeons às músicas. Ricardo Horn com alguns bons momentos de
guitarra também não comprometeu, assim como Maltz, agora com suas levadas de
bateria um pouco limitadas, aparentemente pela nova (e maior) formação.
Humberto manteve suas boas linhas de baixo, soando como um baixista mais “tradicional”,
perdendo muito da pegada mais “guitarrística” que Augusto Licks, dizia que ele
tinha.
O disco
abre com a música “Hora do Mergulho”, mais exatamente ainda, com um coro infantil cantando à capella em sua introdução, precedendo à
entrada da banda e o bonito arranjo de guitarra de Ricardo Horn. Ele também
apresenta um bom solo no meio da canção. Humberto adiciona uma linha de baixo,
fazendo um acompanhamento com acordes, algo não tão recorrente no instrumento.
Na letra, Gessinger continuava mandando bem, rebuscando seu estilo e
mitificando sua imagem: “Eu sou um
déspota esclarecido/nessa escura e profunda mediocracia”. “À Perigo,” já apresenta o acordeom de Casarin, instrumento que seria uma marca do disco. Deluqui (pasmem!) realiza um bom solo de
guitarra. Humberto fala de resistência: “eu
sigo em frente, pra frente eu vou/eu sigo enfrentando a onda/onde muita gente
naufragou”. “Simples de Coração”
tem a melodia reaproveitada da música Sweet
Begônia II (cuja letra consta no encarte do disco A Revolta dos Dândis, mas nunca foi lançada pela banda). Cantando corajosamemente em tons mais altos, esse talvez seja o melhor disco de Humberto
como vocalista. “Lance de Dados” tem
uma levada acústica e traz a participação especial do percussionista Luís Conte. A temática segue falando em
resistência, sobrevivência, novos rumos e comenta sobre um acidente
automobilístico sofrido por Humberto pouco tempo antes: “Os deuses jogam pôquer/E bebem no saloon doses generosas de BR101”.
“A Promessa” foi a música de lançamento
do disco, um bom trabalho de Horn e Deluqui fazendo dobras nas guitarras e o
piano de Casarin. Gessinger recorria à sua linha de crítica social: “Propaganda é a arma do negócio/No nosso
peito bate um alvo muito fácil”. “Por
Acaso” ressalta a mistura que resultou na sonoridade do disco, um lado
acústico com violões e acordeom induzindo à música gaúcha e, de outro lado, guitarras
que puxavam um pouco para o hard rock
setentista (essa era inclusive a principal referência do novo visual da banda).
“Ilex Paraguariensis” gravada apenas
com instrumentos acústicos traz mais claramente a influência da música gaúcha desde o título que leva o nome da erva-mate com a qual se faz a bebida tão apreciada nos pampas: “Hoje eu acordei mais cedo/Tomei sozinho o chimarrão”. “O Castelo dos Destinos Cruzados” de
Carlos Maltz, Ricardo Horn e Kleber Lúcio trazia o baterista novamente nos
vocais desde a música “Filmes de Guerra,
Canções de Amor” gravada no segundo disco da banda. “Vícios de Linguagem” tem Casarin brilhantemente tocando piano e
um hammond B3 e participação especial
de Julia e Maxime Waters e Carmen
Twillie nos backings vocals cantando versos em inglês que evocam muito o Pink Floyd. “Algo Por Você”, parceria de Gessinger e Deluqui, tem um efeito de
distorção na voz que soa interessante na primeira audição, mas logo se torna
cansativo nas audições seguintes. “Lado A
Lado”, de Gessinger e Casarin, tem letra e melodia comoventes que ganham
muito com o coro de Kipp e Mark Lennon. Kevin Cronin, vocalista da banda REO Speedwagon também participa da faixa, tocando violão. A letra
traz mais uma referência à obra de Roberto
e Erasmo Carlos (“Esqueça
as curvas da estrada de Santos/Se tu quiseres saber quem eu sou”), dupla citada algumas vezes por Humberto em músicas como “Nossas Vidas” e “Sopa de Letrinhas”: Apesar dos esforços, a formação não emplacou. Humberto nunca pareceu ter realmente gostado do quinteto, nem do disco. O que foi comprovado com a dissolução da formação no ano seguinte, com Humberto investindo num projeto "quase" solo que foi o Gessinger Trio, para em seguida reformular os Engenheiros do Hawaii com novos integrantes, dessa vez até mesmo sem a presença do co-fundador da banda, Carlos Maltz.
P.S.: Eu sempre
me pergunto por que continuar a escrever textos e resenhas como essa, se como
dizia Ezra Pound: “a melhor crítica não adiciona nada para
quem lê”. Ou como canta Humberto Gessinger em "Vícios de Linguagem": “o principal fica fora do resumo”. Talvez
estes textos sirvam como despretensiosas recomendações aos poucos leitores,
talvez sirvam para iniciar algumas discussões musicais, ou ainda, e mais
provavelmente, não sirvam realmente para nada.
Em tempo:
reproduzo abaixo nos comentários, o que escrevi na citada postagem de Humberto
Gessinger que traz ainda um comentário de pessoa uma anônima sobre o tamanho do texto que escrevi na ocasião.