terça-feira, dezembro 20, 2011

I Me Mine - A Autobiografia de George Harrison




A leitura da vez é a autobiografia de George Harrison, I Me Mine, lançada originalmente pela Genesis Publications em 1980 numa edição limitada de apenas duas mil cópias e tem seu título emprestado de uma de suas canções da fase-beatle, lançada no disco Let It Be, a edição que chegou às minhas mãos é a de 2002 lançada pela Chronicle Books e tem uma introdução assinada pela sua viúva Olivia Harrison . O livro não chega a ser mesmo o que se poderia chamar de uma biografia, o texto não é muito linear e embora siga uma ordem cronológica, George pula fases e acontecimentos importantes. Ele consiste em três partes sendo que na primeira George narra para seu ghost-writer Derek Taylor, ex-assessor de impressa dos Beatles os fatos que ele queria desabafar da sua vida. Derek Taylor adiciona notas no decorrer da narrativa esclarecendo alguns detalhes e dando uma visão mais histórica dos fatos. Sobre os Beatles, George deve ter suposto que todo mundo já sabe tudo e se resumiu mais aos bastidores e mostrar o lado chato da Beatlemania para quem era um beatle. Nesse caso, o beatle que provavelmente se divertiu menos com aquilo tudo. (Realmente deve ser horrível ganhar milhões de dólares, conquistar número igual de admiradores do seu trabalho que exaltam sua genialidade e ter um monte de garotas lindas correndo atrás de você por todos os cantos. Pensando nisso eu até desmanchei uma banda que eu tinha há uns anos atrás quando o risco dela se tornar um sucesso mundial se tornou iminente. Quem pensa diferente do George e de mim é seu ex-parceiro de banda Paul McCartney que não satisfeito com os resultados da Beatlemania, criou os Wings depois do fim dos Beatles que resultou na Wingsmania, e continua a carreira solo difundindo a Maccamania em qualquer país onde ele pise para fazer um concerto. Pobre Paul, deve ser um saco levar a vida assim).

Brincadeiras à parte, é muito honesto quando George reclama de algumas situações que eles passaram como o caso de Manila, nas Filipinas, quando foram quase linchados por não comparecem a uma festa da família real; os eventos formais que eles tinham que comparecer, as autoridades que eram obrigados a receber, a falta de liberdade para sair normalmente às ruas sem o assédio louco das fãs e todo tipo de pressão que eles sofriam que culminou na sua frase: “eles (o público) nos deram seu dinheiro e nós lhes demos nossos sistemas nervosos”. Enfim, é o preço que se paga.  Será que ele abriria mão de todo o lance beatle para ser um simples herói da classe trabalhadora inglesa? Ou trocaria os rendimentos de um músico mundialmente famoso pelos de um jardineiro (que era seu grande hobby) como ele gostava de se auto-intitular? Abandonaria os jardins-quase-da-babilônia da sua casa-mansão-quase-castelo pelo quintal da casa da Rua Arnold Grove para viver feliz no anonimato? Todas as coisas passam e nenhuma delas é perfeita, George.

No mais, ele fala da Índia pela questão espiritual (tem também um trecho muito bom aonde ele comenta sobre seus estudos de cítara e das técnicas para se tocar o instrumento), do relacionamento com os humoristas do Monty Pyton que não por acaso são as passagens mais leves e alegres da narrativa e um pouco de Fórmula 1 nas pouco mais de 60 páginas reservadas a tal autobiografia que parece mais com trechos editados de uma entrevista do que um livro em si, porém, suficiente para ele reclamar tanto do lado chato que a popularidade rende que já estava quase me sentindo culpado por ser beatlemaníaco, fico aliviado de pelo menos nunca ter cruzado com ele e o incomodado pedido um autógrafo ou tentando explicar em 15 segundos como sua música foi importante para mim. Sem se preocupar com detalhes, ele corta da fase Hamburgo direto para a Beatlemania nos EUA, não comenta sobre processos de gravação, não aborda quase nada da carreira solo, enfim tudo soa muito vago e superficial para um livro que pretendia ser uma biografia, até porque nem mesmo da sua vida ele fala muito. E o John Lennon ainda ficou sentido por achar que não teve seu nome citado como deveria no livro, mas ele aparece lá mais do que qualquer um dos outros Beatles e das duas esposas do George ou seu filho Dhani. O texto é entremeado com alguns belos desenhos que são um ponto positivo do livro, eles mostram desde localidades das cidades de Liverpool e Londres a violões e figuras orientais, sobra espaço até para um Porsche de George.

A segunda parte é dedicada às fotografias, uma sequência de imagens em preto e branco, com algumas fotos raras do arquivo pessoal do músico. Mas o grande valor desse livro está mesmo na terceira parte, um capítulo com todas suas letras comentadas por ele mesmo que revela uma série de fatos interessantes acerca das canções, pena que por ter sido escrito em 1980 e não tenha tido uma versão atualizada não contenha comentários sobre as canções dos trabalhos subseqüentes de George. Um detalhe especial são as reproduções de todas as letras nos originais escritos à mão por George, "Don´t Bother Me" e "Think For Yourself" foram reescritas por ele na época do lançamento porque ele não disponibilizava mais dos seus originais. Em alguns casos, as folhas originais mostram alguns desenhos de George que carregam alguma relação com o conteúdo da letras.

O capítulo da “autobiografia” acaba deixando uma sensação triste que eu sempre tive de um George rancoroso (como acho que também sou) embora aparentemente espiritualizado (como acho que também sou). Penso que ele passou todo esse tempo procurando um pouco de paz e harmonia para sobreviver nesse mundo cão, espero que tenha encontrado nas quase duas décadas de vida seguintes ao livro e onde estiver agora. Hare Khrisna.

3 comentários:

  1. Sempre achei o George (na dele). Tenho vontade de ler esse livro também. Sendo beatlemaníaco, eu fico me perguntando coisas como: Como ele sentia o império Lennon/McCartney limitar a ele uma ou duas músicas por disco? Vou me estender demais aqui mano rs, recomento de casa, i´m in the job rs.

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  2. O George eu tenho ele como um irmão, Paul o tio legal, John o primo irreverente que quase não vejo e Ringo o amigo da escola... eu fico pensando como foi que os dois gênios receberam While My Guitar, Not Guilty, Old Brown Shoe, entre tantas outras... Jamais vou perdoar o Paul pela ranhetice com George no Let it Be, porra, aquilo dá vontade de entrar na TV e falar pro Paul: Quiéissu cara, precisa falar com o mano assim? Cê bebeu? Entendo o perreio que eles estavam passando na época, e que quando se perde a razão tudo foge de controle, mas não gostei de ter visto isso. Amo JPGR, são meus professores. Junto com Roberto Carlos e Elvis Presley. Para mim a manifestação dele como se dissesse: Estou cheio, então Toma (igual o Seu Madruga) foi o lançamento do All Things Must Pass, álbum triplo! Canções precisavam ganhar corpo ser gravadas e lançadas.

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  3. Graaaande Baratta!!!

    Tenho uma admiração enorme pelos quatro, a resenha tem um certo tom crítico mas é mais exatamente sobre o livro e ele acaba deixando um pouco essa coisa ressentida mesmo que eu acho que o George sempre teve. O All Things Must Pass é um álbum perfeito, mas depois o George não produziu com tanta frequência. As carreiras solos acabaram mostrando uma coisa que já rolava nessa fase dos Beatles, o Paul sempre produziu muita coisa, era um pouco mais frenético nesse aspecto e de uma certa forma realmente já existia o império Lennon/McCartney nos discos e se analisar bem vai ver que muita coisa deles também ficou de fora por questões de espaço. E essa reação do Paul no Let It Be não tem nada de condenável para mim (na verdade eu não acho legal é que isso tenha ido parar no filme), é coisa de banda mesmo, de relacionamento, o George também não estava fazendo papel de anjinho nessa discussão não. Foi uma época que já estava todo mundo meio saturado. É o tipo de situação que não dá para a gente querer entrar no meio nem tomar lado nenhum, meio briga de irmão...o que fica de positivo é que eu acredito que eles mantiveram uma certa amizade até a morte do George...acho bacana o lance do Paul ter dito que foi visitar o George no hospital já na fase terminal e ficar segurando a mão dele e não se lembrar de ter segurado a mão de outro homem antes, isso é o que fica para mim junto com o trabalho deles, as desavenças são normais e às vezes até necessárias (tu tens banda e sabe bem disso, hehe).

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