Várias Variáveis (1991)
Depois d'O Papa é Pop, os Engenheiros do Hawaii
apareceram com mais um título e uma canção propositalmente cheia de
aliterações, "A Pampa é Pobre/O país é pobre/É pobre à pampa/O PIB é
pouco/O povo pena, mas não pára/A poesia é um porre/O poder, o pudor/Várias
Variáveis/O pão, o peão/A pátria à flor da pele pede passagem...". Era a
canção "O Sonho é Popular",
anunciando um dos melhores discos da banda e servindo de prelúdio para a
regravação de "Herdeiro da Pampa
Pobre" de Gaúcho da Fronteira
e Vainê Darde. Prato cheio para Augusto Licks apresentar mais um de
seus personalíssimos solos, usando a técnica de tapping que consiste em tocar com as duas mãos na escala do
instrumento. Augusto imprime personalidade ao buscar inspiração na
música gaúcha e consegue soar diferente no uso de uma técnica na qual todos
guitarristas soam iguais. “Sala Vip” é uma das canções mais pesadas e agressivas gravadas pela banda, tanto no
instrumental quanto na letra ("Não, nem vem que não tem, eu não devo nada
pra ninguém", "Tô de saco cheio, chega, deu pra mim, eu não sou do
meio, não sou do meio termo, quero todos os gestos ou nenhum"). “Piano Bar” é outra balada com base nos
teclados, agora nos comandos de Humberto
Gessinger, deixando o parceiro Augusto livre para executar
mais um marcante solo de guitarra. “Ando
Só” mostra o trio "redondinho", com a bateria de Carlos Maltz com bastante punch, e as boas linhas de baixo e guitarra que inclusive dialogam durante o solo num jogo de pergunta e resposta. “Quartos de Hotel”
com seu riff pesado na introdução surpreende o ouvinte ao desembocar numa base
de violão transformando a canção numa balada que logo no primeiro refrão
retorna ao clima mais pesado e fecha o lado A.
O lado B surge com a vinheta que leva o nome do disco, uma colagem de
sons e ruídos, no melhor estilo “Revolution
#9” dos Beatles, que apresenta
mais uma vez um riff que apareceria em vários discos da banda (vide as músicas “Vozes” e “A Verdade a Ver Navios” presentes no segundo e terceiro discos dos Engenheiros respectivamente). “Sampa No Walkman”
inicia com o mesmo riff de “Quartos
de Hotel”, assim como eles já haviam feito em “A Revolta dos Dândis I e II”. A música presta uma homenagem a Caetano Veloso e a cidade de São Paulo
(“a mesma esquina em outra canção”). Dois
grandes instrumentais com dois solos perfeitos de Augustinho em ótima forma e
domínio total de seu instrumento. “Muros
E Grades” com um baixo pulsante e a bela introdução executada numa guitarra
12 cordas, se tornou um dos clássicos da banda com mais uma das instigantes
letras de Humberto (“então erguemos os muros que nos dão a garantia de que morreremos
cheios de uma vida tão vazia”; “levamos uma vida que não nos leva à nada”). “Museu de Cera” mantém a mesma pegada
com instrumental vigoroso e o uso de samplers como em outras faixas do disco. Os versos finais são cantados à capella (o mesmo acontece na última faixa do disco). Na sequência, dois momentos acústicos e bastante despojados que
dão a impressão que a banda gravou tocando ao vivo no estúdio, com Humberto ao piano,
Licks no violão e Carlos na percussão, eles apresentam a breve “Curtametragem” ("A vida é uma viagem, passagem só de
ida"..."A vida é uma viagem, bebida sem gelo engolida às pressas, às
vésperas da sede"), nessa, eles erram no meio e recomeçam a canção; assim
como fazem na introdução da música subsequente, “Descendo A Serra”, que traz mais alguns bons versos da verve "gessingeriana" (“é sempre mais difícil dizer adeus quando não há nada
mais pra se dizer”). Depois do bucolismo das duas baladas, outro momento
quebradeira com a música “Não É Sempre”,
Humberto apresenta ao longo do disco toda uma série de letras inspiradíssimas
com seus trocadilhos cortantes e aqui não é diferente ("Acontece que eu
não nasci ontem e até hoje sempre escapei com vida", “não queria estar no
meu lugar, não queria estar em lugar nenhum), Augusto Licks comparece com mais
um grande solo. Para fechar, “Nunca é sempre”, uma segunda parte da canção anterior com a mesma
harmonia da primeira faixa do disco que o liga e o fecha como se fosse um
livro.
A exemplo do disco anterior (O Papa É Pop), Várias Variáveis também teve a
produção a cargo da banda, na verdade, como diria Carlos Maltz no mesmo ano: “o
Augusto produz tudo, e quando ele grava eu o produzo”. A capa verde marca um
retorno à trilogia idealizada a partir do segundo (amarelo) e terceiro (vermelho) discos da banda
com as cores inspiradas na bandeira do Rio Grande do Sul, mas que
havia sido adiada em razão do disco ao vivo (Alívio Imediato) e d'O Papa
É Pop que eles consideram acidentais
na trajetória discográfica da banda. Circulando uma foto do trio temos uma cobra mordendo o
próprio rabo dando ideia de continuidade. As engrenagens continuam, agora apresentando
símbolos da cultura pop como o Mickey
Mouse; uma paródia da Coca-Cola aonde
lê-se Beba Chimarrão no lugar do nome da marca de refrigerantes;
distintivos dos clubes de futebol gaúchos, Grêmio
e Internacional; o “Senta a Púa” da Força Aérea Brasileira e o “Já te
atendo, tchê!” do Esquadrão Aéreo Pampa (com a também figura de outro
personagem da Disney, o Zé Carioca, travestido de “Zé Gaúcho”
com direito à cuia de chimarrão); o símbolo das Nações Unidas; um antigo discador de telefone; o trifólio, símbolo
da radioatividade; o desenho o Homem Vitruviano de Leonardo Da Vinci; uma moeda de cruzeiro; a pirâmide iluminatti das notas de um dólar e até
um Smile . A ideia original era usar logotipos de diversas marcas de carros,
mas houve receio por parte da gravadora com o risco de problemas com as
empresas, o que levou às mudanças no projeto. A contracapa traz ainda mais uma
série de variações dessas engrenagens, com o logotipo da gravadora RCA, da Cruz
Vermelha, o cartaz de Proibido Fumar, estrela de Davi, o “A” de anarquia, e os
símbolos de masculino e feminino.Várias Variáveis é um dos discos mais
rockeiros da banda e ao mesmo tempo manteve um pouco da vertente progressiva
que a banda sempre cultivou embora nunca tenha entrado de cabeça nela.
Obs: assim como os Engenheiros fizeram com o disco Várias Variáveis, eu
dedico essa postagem ao homem só, seja ele quem for, esteja onde estiver.
Grande postagem mano.
ResponderExcluirEu curto ler seus textos, você sabe que sou seu fã. E você escreve sobre alguns discos que eu também não conheço. Lembro do Dream Academy, do Blue da Joni, Maria McKee (acho que escreve assim), todos grandes discos. Esse aí do Engenheiros eu particularmente não conheço, mas com tantos detalhes sobre letras, referências e notas sobre o instrumental e produção que prometo que ouvirei aqui (é só eu achar, pois eu sei que tenho em mp3) e voltarei pra recomentar, valeu mano.
Grande Abraço.
Bacana, mano. Bom saber que tem gostado de algumas dessas "novidades" que tenho postado. Mas prometo para breve falar dos nossos prediletos em comum!
ResponderExcluirGrande abraço!
Eu conhecia desse disco "Muros e Grades", "Piano Bar", "Herdeiro da Pampa Pobre" e "Ando Só".Só fui conhecer o resto do disco quando o autor do blog me emprestou a fita k7(original diga-se de passagem)e demorei mais de um ano para devolver.Das novidades me chamou a atenção "Sampa no Walkman" por causa homenagem ao Caetano e a São Paulo achei bem interessante alguns trechos da letra, "Estas são elas/ Tuas meninas (nordestinas, erundinas)/
ResponderExcluirtua mais completa contradição.
Eduardo, nem lembrava de ter lhe emprestado a fita. Bons tempos em que as letras do rock nacional te faziam pensar.
ResponderExcluirValeu pelo comentário! Abraço!
Gosto deste disco num sei pq...Tinha uma cobra numa camisa na adolescência!
ResponderExcluirEu gosto e sei porquê. A minha camisa do Várias ainda está aqui.
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